domingo, 18 de abril de 2010

Oliveira

No início era tão pequeno... Apenas uma minúscula sementinha. Diferente de todas as outras pré-oliveiras que já pude conhecer. Apareceu do nada, por acaso, como caída do céu. Nem acreditei quando caiu na minha mão e coube tão perfeitamente. E eu olhava aquela semente, tão pequena e tão linda. Era como se ela falasse. Eu a ouvia pedindo para que eu a plantasse em meu jardim.
Há muito tempo eu esperava por uma semente como aquela, que quisesse o mesmo que eu: um elo com seu jardineiro. Guardei-a. Todo santo dia, ao levantar, eu olhava minha semente na cabeceira. Ela me seduzia... Eu podia sentir seu sorriso ao ver meu rosto amassado de sono. Sabia que eu havia sonhado com ela. Estava sendo assim todas as noites, desde que eu a ganhei do céu.

Um belo dia resolvi levar a pré-oliveira ao meu jardim. Eu queria ver seu brilho diante do sol. Ofuscante!
Fiquei perplexa ao perceber que, por uma breve distração, a sementinha escapoliu da minha mão e caiu na tão fértil terra que eu tinha em meu quintal.
Não havia mais como impedir, como negar, nem como evitar. Daquele momento em diante, eu teria no meu jardim uma crescente Oliveira. Assim foi.

Eu fui abençoada por Deus?! Que árvore linda cresceu em meu jardim!
Não havia de ser o contrário, por tanto que me dediquei àquela muda. Eu a reguei com todo meu amor. Quantos frutos eu colhi... Minha velha sementinha caída do céu se transfora numa dádiva, eu já disconfiava que seria assim. E eu agradecia todas as noites, antes de dormir, por ter sido privilegiada, tendo em minha vida essa graça.

Como nada é perfeito, houve tempo de pragas. De vez em quando, uns vizinhos me inventavam de botar olhado em minha linda. Lá vou eu tratá-la. Em outros tempos, também apareceu aqui uns bichos estranhos, achando que podiam derrubar um tamanho de árvore daquele.
Passadas muitas fases, boas e ruins, de deslumbre e de dor, minha Oliveirinha, ou Oliveirona, não podia mais sobreviver em meu jardim. Meu amor e dedicação não podiam suprir totalmente todas as necessidades que essa planta tinha para manter-se minha. A Oliveira ainda me dava bons frutos. Suas azeitonas sempre foram as mais desejadas de toda região. Mas delas eu extraía líquidos também. Um era o azeite. Tão útil me foi... Quantos pratos saborosos eu não teria preparado sem sua ajuda! O outro líquido chamamos de lágrima. Sim, a Oliveira também me fez chorar. E como fez!
Não há de ser posto em palavras seus motivos. No entanto, o que há de se falar é o quão minha terra estava sem vida. Toda sua fertilidade foi sugada pela minha ex-pré-oliveirinha, que tanto me fez bem um dia.

O curioso fim da minha breve e intensa relação com aquela planta que havia caído do céu, foi simplismente o fogo.
O elo não transmitia mais sintonia, e sim faíscas, que cada vez mais foram se atiçando, provocando um terrível incêndio no meu antigo quintal. Meu coração doeu tanto ao ver aquela cena! Mas essa dor se tornou auto-suficiente. Dor para dor. Minha dor passou.

Ainda me lembro muito bem de cada momento que tive com minha planta. Sempre lembrarei dela como uma rara semente que brotou em minha terra, mas que foi levada pelas pragas que ela mesma atraíra, assim como havia me seduzido um dia. Mas foi a única Oliveira que tive em meu jardim, ainda tem meu carinho guardado aqui no peito. Que por em ambos, que são um só, está quase curado por completo. Sua terra recuperou a fertilidade. Hoje, nela crescem lindas flores. Sua grama é tão verde que traduz o mais belo significado da natureza. Não há Oliveiras, nem Pinheiros. Não há nenhum sobrenome, nem se quer rastro de que houve um incêndio.
Há aquele espacinho ali, reservado, para tão logo brotar uma sementinha graciosa, enviada pela vida, não mais pelo nada.


Escrito a ti por: Flora Lis